Por Sérgio Teixeira Jr., de Nova York
Mídia sem tinta nem papel
Com publicações exclusivamente criadas para o iPad, Rupert Murdoch e Richard Branson buscam uma alternativa para a mídia na era digital
O australiano Rupert Murdoch e sua esposa Wendi Deng . RUPERT Murdoch's wife, Wendi Deng
Um, o australiano, é filho de um jornalista que seguiu carreira nos negócios da imprensa e deixou para o filho uma coleção de jornais na Austrália. A ambição de Rupert Murdoch, porém, era ainda maior que a de seu pai: hoje ele é dono de um dos maiores impérios de mídia do mundo, a News Corp., cuja joia da coroa é o Wall Street Journal. O outro, o britânico, é filho de um juiz e não herdou empresa nenhuma. Mas Richard Branson também começou na imprensa com uma revista estudantil lançada na adolescência. Hoje, seu grupo Virgin é um conglomerado global que inclui operadoras celulares, emissoras de rádio, fábricas de bebidas, uma empresa de aviação e uma companhia que pretende levar gente para o espaço. Murdoch e Branson, cada um à sua maneira, devem tudo à palavra impressa. Mas, a julgar pelos anúncios das últimas semanas, ambos veem mais do que tinta ou papel no futuro.
Murdoch deve lançar no começo do próximo ano o The Daily, um jornal diário puramente digital. Isso, em si, não é a novidade: a curta história da web viu o nascimento e a morte de incontáveis sites cuja intenção era ser uma fonte de notícias e conteúdos originais. A diferença é que o novo jornal do bilionário australiano só poderá ser lido por quem tem um iPad, o computador em forma de prancheta lançado no começo do ano pela Apple. Murdoch montou uma equipe de 100 jornalistas e contratou gente de publicações de prestígio. Sua expectativa é que, nesse novo tipo de aparelho, o negócio da mídia possa resolver uma equação que até agora não tem solução: como ganhar dinheiro no mundo digital?
Conteúdo pago
A esperança é que o iPad represente um ganha-ganha. Para quem lê, um tablet traz conforto. O conteúdo pode ser apresentado de forma mais cativante. O formato do aparelho, sem a inconveniência do teclado, permite que a leitura seja parecida com a do jornal tradicional. Um aplicativo de iPad preenche toda a tela. Do ponto de vista do negócio, há menos distrações — e menos oportunidades de fuga do leitor. Isso também quer dizer mais atenção para o conteúdo publicitário, que pode ainda ser enriquecido com múltiplas fotos, vídeo e música. De acordo com essa lógica, o duplo benefício — para o consumidor e para a indústria da mídia — pode ser alcançado a um custo mais baixo, pois o produto é entregue online. Murdoch estaria investindo 30 milhões de dólares no The Daily. Além disso, no mundo iPad, os usuários estão acostumados a pagar pelo conteúdo, porque muitos dos programas são comprados online na loja da Apple. Por uma assinatura que deve custar 99 centavos de dólar por semana, e com estimativas — conservadoras — de uma base instalada de mais de 30 milhões de iPads no próximo ano, não representaria um risco grande para a News Corp., um conglomerado que fatura 33 bilhões de dólares por ano.
A digital Project Mag: o primeiro negócio do dono do grupo Virgin, que vai de empresas de aviação a telefônicas, foi uma revista
“Não faz sentido”, disse Sarah Chubb, responsável pela área digital da Condé Nast, uma das mais prestigiadas editoras americanas, num evento recente em Nova York. Para ela, a experiência de ler o noticiário num ambiente fechado como o de um aplicativo de iPad deixa de lado as interações sociais em sites como o Facebook, que hoje são importante fonte de descoberta de informações. (Os aplicativos iPad das revistas Wired e New Yorker, dois títulos da Condé Nast, têm o mesmo problema.) “Murdoch está brigando com (o espírito aberto da) a internet, e a internet continua vencendo”, escreveu Matthew Ingram, do influente blog tecnológico GigaOm.
“Não tenho a menor ideia”, disse Branson, às gargalhadas, quando questionado sobre o porquê do lançamento de sua revista de variedades, Project, no iPad, e não como um website. Cada edição da Projectcusta 2,99 dólares. Muitas revistas (entre elas EXAME) criam versões digitais. Mas a Project de Branson (disponível apenas em inglês) não existe no papel. A primeira edição, entretanto, não tem nada que a torne muito diferente das outras revistas de papel que também decidiram criar uma versão eletrônica. Um jornalista perguntou a Branson se, no fim das contas, não seria o conteúdo o item mais importante, independentemente da plataforma tecnológica em que ele é publicado. “Você tem de ter o melhor conteúdo e a melhor forma. As pessoas têm muitas escolhas hoje”, disse Branson. “E você precisa criar burburinho. As pessoas têm de dizer (umas para as outras): ‘Você precisa olhar a Project!’. Sem isso, nossa morte será rápida. Mas, se criarmos um boca a boca, vamos durar muitos e muitos anos.” O boca a boca, pelo menos, já está criado.
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