Márcio Orsolini e Lucas Amorim
Para bancar a contratação de jogadores estrelados, os clubes de futebol brasileiros partiram para novos modelos de patrocínio - e chamaram a atenção de marcas que jamais haviam investido no esporte
Quando Robson de Souza, o Robinho, decidiu aceitar o convite do Santos para voltar a jogar futebol no Brasil, em janeiro deste ano, não foram somente os torcedores do clube paulista que ficaram surpresos. Diretores de marketing e dirigentes de outras agremiações perguntavam-se insistentemente como o Santos conseguiria arcar com um salário de aproximadamente 1 milhão de reais por mês - uma bolada para os padrões brasileiros, mas 17% menos do que Robinho recebia no Manchester City, da Inglaterra. A resposta veio no mês seguinte, quando o frigorífico Marfrig, dono da marca Seara, topou pagar 15 milhões de reais para ter seu logotipo estampado no uniforme dos jogadores do Santos. O que chamou a atenção, nesse caso, não foi tanto a quantia, a maior da história do Santos - mas como o clube irá utilizála. Parte desse dinheiro vai para uma das quatro cotas de patrocínio que o Peixe criou especificamente para bancar o salário do jogador, algo inédito no futebol brasileiro (o nome das outras três patrocinadoras de Robinho ainda não foi divulgado). Até então, somente o Corinthians havia procurado uma solução fora do comum para conseguir contratar o craque Ronaldo no final de 2008, embora em bases diferentes - pelo contrato assinado com ele, 80% da receita obtida com patrocínio nas mangas da camisa e no calção vai para sua empresa, a R9. Agora, os dirigentes do Santos encontram-se às voltas com outro desafio: descobrir um jeito de esticar o contrato do jogador até o final do ano sem comprometer seu orçamento (oficialmente, Robinho fica só até agosto no clube). "Sem um patrocinador de peso, fica difícil mantê-lo aqui", diz Armênio Neto, gerente de marketing do Santos.
Contratos originais como os fechados com Robinho e Ronaldo, em que boa parte da responsabilidade pelo pagamento dos salários é transferida diretamente para patrocinadores, tornaramse o sonho de consumo de vários clubes brasileiros - e vêm se convertendo numa das principais armas das empresas para projetar suas marcas no Brasil. Além dos "recém-importados" Robinho, Ronaldo, Adriano e Roberto Carlos, jogadores como Ronaldinho Gaúcho, do Milan, e Elano, do Galatasaray, da Turquia, já entraram no radar de Santos, Corinthians, Flamengo e até do São Paulo, normalmente avesso à contratação de grandes estrelas. Ao analisar a matemática por trás desse tipo de operação, fica fácil entender as razões de tamanho frenesi. Do 1 milhão de reais prometido a Robinho, o Santos vai desembolsar apenas 160 000 - 40 000 reais a mais que o montante pago ao jovem Neymar, revelação do time. E, apesar de a Seara bancar parte de seu salário, o jogador ficou livre para assinar contratos com outras empresas sem a necessidade de repassar um centavo sequer ao clube, como fez recentemente com a montadora Volkswagen. "Essa modalidade de patrocínio específico para pagar salário de jogador só existe no Brasil", diz Amir Somoggi, da consultoria Crowe Horwath, especializada em esporte.
É bem verdade que o fato de esses jogadores estarem vivendo um momento particularmente difícil na Europa ajudou - e muito - os clubes brasileiros. Ronaldo estava desempregado quando aceitou vir para o Corinthians. O banco de reservas era al go cada vez mais frequente na rotina de Robinho. E a polêmica em torno do jeitão briguento de Adriano havia desgastado sua imagem na Itália. A má fase nos gramados europeus não impediu, no entanto, que esses craques se convertessem numa máquina de bons resultados no Brasil - pelo menos financeiramente. Com a chegada de Robinho, em janeiro, a bilheteria do Santos cresceu 114% no mês de março em comparação com o mesmo período do ano anterior. No Corinthians, a venda de camisas com o número 9, de Ronaldo, subiu mais de 50% desde sua chegada, superando todas as projeções da Nike, fornecedora de material esportivo do time. "A contratação de jogadores es trelados serviu de chamariz para outras marcas", diz Luís Paulo Rosenberg, diretor de marketing do Corinthians. "Graças a Ronaldo, o clube conta com um patrocínio superior a 50 milhões de reais ao ano."
Mesmo que outros contratos com jogadores milionários jamais saiam do papel, a mera possibilidade de vincular uma marca a ídolos internacionais já provocou uma importante mudança no futebol brasileiro. Empresas que nunca haviam investido nos gramados correram para despejar um caminhão de dinheiro nos clubes, na óbvia esperança de ganhar com a exposição. Em abril de 2009, a Hypermarcas iniciou com o Corinthians o que viria a ser o maior patrocínio da história do futebol nacional - um aporte de 40 milhões de reais. Pouco depois, o banco Panamericano, do Grupo Silvio Santos, também decidiu patrocinar o clube. Em fevereiro, foi a vez do frigorífico Marfrig fazer sua estreia no futebol. "Ficamos tão satisfeitos que estendemos a parceria à seleção brasileira e à Fifa", diz Ricardo Florence, diretor de planejamento estratégico da Marfrig.
Embora pareça um jeito simples de expor uma marca, bancar um jogador de futebol envolve riscos - tanto para o patrocinador quanto para o clube. Primeiro porque esse tipo de contrato geralmente vigora apenas enquanto o craque estiver ligado ao time, deixando o clube de certa forma refém de sua contratação. No acordo que fechou com o Corinthians, em março de 2009, a Batavo deixou claro que os 18 milhões de reais anuais em patrocínio seriam reduzidos à metade caso Ronaldo deixasse a equipe. Do ponto de vista das empresas, o perigo está em associar a imagem a ídolos de reputação, digamos, duvidosa. O craque Adriano, patrocinado pela Olympikus, virou habitué das páginas não esportivas de jornais por causa de brigas com sua ex-noiva Joanna Machado. Na última delas, ocorrida em 5 de março durante um baile funk numa favela carioca, Adriano só não partiu para a agressão física porque foi impedido pelos amigos - mas acabou suspenso pelo clube na partida contra o Caracas, da Venezuela, pela Copa Libertadores dias mais tarde. Esse tipo de comportamento explica, em grande parte, por que Adriano ainda não conseguiu atrair outros patrocinadores para o Flamengo, apesar de as vendas de material esportivo do time terem aumentado em 50% desde sua chegada. Um sinal evidente de que, mesmo no milionário mundo do futebol, as empresas não estão dispostas a pagar qualquer preço.
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